segunda-feira, 20 de novembro de 2017

“A Catedral do Mar”(Ildefonso Falcones): amor e liberdade

Século XIV. Barcelona dos sonhos de muitos e da riqueza de poucos. O bairro dos pescadores. Bernat Estanyol, um servo da terra, tinha fugido da vingança de um senhor feudal e quer ser um homem livre. Santa Maria do Mar, a Igreja que se desenha pano de fundo duma trama romanesca grandiosa, de ódios e amores, histórias e estórias que se mesclam nas ruas, nas casas de personagens de autêntica sensibilidade, de uma humanidade tocante. Há fugas, fome, violência, castelos e traições, raiva, e desengano, amor, encontros furtuitos, desditas que se compõem em fios de vida, correrias de crianças que, na praia, enfrentam a noite e o desconhecido…
O jovem Estanyol trabalha arduamente para ajudar a construir aquela que será também a sua Igreja, sublime construção perto do mar, no Bairro da Ribera, onde as gentes se encontram mais tarde, para olhar e venerar a Virgem que sorri (e ainda hoje sorri, se olharmos atentamente, mistério de uma cidade que nos envolve com paixão…).
Logo no início do romance, uma festa de casamento. Dois jovens e a respetiva família. Festa. Alegria. Cavalos ao longe… E tudo muda… para sempre… inevitavelmente. Tudo por causa de um direito que não se quer aceitar e que o senhor feudal faz valer. Nada mais será como seria suposto. E a estória se enreda nos factos que fluem, com uma técnica capaz de prender até à última página. Esfregamos os olhos, incrédulos, perante a capacidade de o autor nos fazer vivenciar a história de todas aquelas pessoas, que são, entretanto, também, ou da nossa família, ou da nossa rua ou bairro, mas, certamente, da nossa mais profunda imaginação e entranhados nas nossos sentimentos de leitores. Mistério e intriga urdidos ao pormenor, meticulosamente. Peripécias que fascinam, intensas, vibrantes, galopantes…
História e ficção misturam-se nesta obra de Falcones, numa Barcelona de contos medievais. No fim, a vontade premente de cruzar a porta magnífica que viu os bastaixos com as pedras às costas, dia após dia, a chorar as mágoas e a celebrar a vida.

A continuar, para quem não resistir, “Os Herdeiros da Terra”, do mesmo autor, talvez menos poético, talvez menos propenso ao sonho, mas igualmente digno de uma Barcelona férrea de lutas e glórias.
Glória Pires