(d)escrever o Natal
Natal – um tempo de magia mas, acima de tudo, um tempo de escolhas: escolher os presentes, os doces para a ceia, a roupa que queremos usar, os jogos de família, as decorações da casa, e por aí fora. Neste ano atípico, cabe-nos a nós fazer uma outra escolha, bem mais séria: com quem / como vamos passar o Natal. Em anos anteriores, se nos dissessem que esta é uma escolha séria, a nossa resposta seria uma grande gargalhada; agora, é uma decisão que dá que pensar.
Penso que todos concordamos que o espírito
natalício está, mais do que na ceia e na troca de presentes, na harmonia e na
felicidade experienciadas entre aqueles que reunimos à mesa. E é esta reunião
que, neste Natal, se pode traduzir nalgo bem mais trágico que as discussões de
família ou as barrigadas de doces – doença e fatalidade. Embora este aparente
ser um ponto de vista extremamente pessimista, há situações em que o pessimismo
é necessário, como é o caso desta. É o pessimismo que nos faz repensar se
devemos ou não colocar o espírito natalício à frente da saúde, e não só da
nossa, mas de toda a Humanidade; é o pessimismo que nos faz prestar mais
atenção às medidas de segurança que devemos levar a cabo nas festividades que
se aproximam, ao invés de as ignorarmos “só por um dia ou dois”; é o pessimismo
que nos faz pensar naqueles que combatem a pandemia na linha da frente, e que
possivelmente terão de abdicar do seu Natal para salvar a vida de outros; é o
pessimismo que nos faz refletir acerca das nossas decisões, e do modo como
estas podem afetar irreversivelmente a nossa vida e a do próximo.
Nos Natais passados, diríamos que, acima
de tudo o resto, o mais importante é passar o Natal com quem amamos; neste
Natal, há que abrir uma exceção. Com toda a certeza que passar o Natal apenas
com “os de casa” é profundamente desagradável mas, nesta época de compaixão,
devemos pensar não só em nós e nos nossos, mas na sociedade enquanto um todo.
De que nos vale reunirmo-nos com toda a nossa família se, uns dias depois,
estivermos a sofrer ao pensar na saúde debilitada dos nossos parentes
infetados? E os mais velhos? O que lhes acontecerá se contraírem o vírus? E se,
após o Natal, tudo piorar e tivermos de voltar ao confinamento? O que acontece
àqueles que não podem ficar em teletrabalho? E a economia, como vai ficar?
É certo que não podemos prever o que
acontecerá no futuro, porém, podemos evitar uma tragédia maior do que a que
vivemos. Para tal, é importante reduzirmos as presenças na nossa ceia natalícia
apenas às daqueles com os quais convivemos diariamente. E não é por isso que o
espírito natalício está arruinado: há que saber apreciar a presença dos que nos
são próximos pois, por vezes, acabamos por nos esquecer do lugar importante que
eles tomam nas nossas vidas.
Maria Fontão (12ºC)