domingo, 6 de março de 2022

Entrevista ao professor José Bento da Silva

 Entrevista produzida pelos alunos das turmas do 9.º anoC e D, do professor José Manuel Medeiros .


(Professor José Bento, foto de capa do seu facebook).


Olá, professor José Bento!

                Soubemos, através do nosso professor José Medeiros, que foi, durante muitos anos, docente na nossa escola; que assumiu outras funções, durante o seu percurso; e que, antes de se retirar, premiou os seus colegas com “A última aula”. Assim senso, quisemos aproveitar esta oportunidade para lhe colocar algumas questões, que  a sua experiência e o seu arguto humor poderão condimentar e nós, naturalmente, ficarmos mais cientes daquilo que nos rodeia e interessa, enquanto estudantes e pessoas informadas, certos de que “perguntar a quem sabe já é saber metade”.

 1.       Estamos no nono ano, quando temos de tomar decisões sobre o nosso futuro. Provavelmente, o professor também sentiu algumas hesitações/inseguranças enquanto adolescente. Quando é que  definitivamente descobriu a sua “vocação”?

 Prof. José Bento: Quando descobri definitivamente a minha vocação?… Comigo não houve propriamente uma descoberta da vocação, nem tão pouco tenho a convicção de que tenha tido uma vocação… Percorro os significados do conceito “vocação” e o que encontro? … arte, chamamento, eleição, escolha, génio, inspiração, jeito, pancada, predestinação, propensão, queda, talento, tendência, tineta, veia…

Quando era criança/adolescente, eu elegeria ser jogador de futebol, mas não tinha, nem jeito, nem talento, nem queda e muito menos génio…

Penso que o nosso caminho vai-se fazendo caminhando, tentando sempre, e muito do que nós viermos a ser também vem um pouco da sorte, dos contextos, da nossa origem social, das possibilidades dos nossos pais. No meu tempo era assim, mas agora as coisas são diferentes.

Eu fui experimentando vários caminhos. A minha mãe era solteira e ganhava pouco dinheiro. Nesse tempo, a escola só era obrigatória até à quarta classe… fui operário em França, fui militar, depois ferroviário – estudando sempre fora do horário de trabalho - e quando terminei o curso universitário concorri ao ensino e gostei, dei-me bem na arte de ensinar, não era um bom professor, mas gostava de ensinar. E a minha experiência de vida anterior foi muito útil para saber lidar com os alunos. Sabia quanto custava a vida.

 2.       Recorremos, quase sempre, a um plano B. Então, se não tivesse sido professor, que outra profissão poderia ter abarcado?

 Prof. José Bento: Se não tivesse sido professor gostaria de ter sido jornalista. Gosto de ler e escrever e o jornalismo foi um sonho já tardio, que agora realizo colaborando na imprensa regional.

 3.       Entre o seu e o nosso tempo de estudante, acentuaram-se as diferenças. Qual foi a alteração sentida que mais o incomodou e a que mais o entusiasmou?

 Prof. José Bento: Sim, tem havido muitas reformas, muitas alterações e muita evolução e isto é bom; no meu tempo havia, por exemplo, mais disciplina, mas também mais inibição e nenhuma democracia (ou quase nenhuma democracia) na sala de aula; a escola democrática é um valor que eu valorizo e aprecio no tempo da vossa geração.

 4.       Nós, por exemplo, temos grande dificuldade em concentrarmo-nos, para que possamos ouvir, maturar a informação e, depois, aprender de forma significativa. Tem alguma panaceia para que possamos minimizar os danos?

 Prof. José Bento: Com todo o respeito e compreensão, devo dizer que para a vida, para a construção da nossa vida não há panaceias. As fases da adolescência e da juventude são as nossas melhores idades, mas há tempo para tudo e o estudo devia merecer de todos nós a maior responsabilidade e empenho, porque o futuro de cada um e do país depende do trabalho de todos.

 5.       À semelhança do nono ano, no décimo vamos ler e conhecer obras integrais. Como é que o prazer de ler se entranhou na sua vontade?

 Prof. José Bento: Não sei francamente como isso aconteceu, mas aconteceu simplesmente. Por que é que nós nos apaixonamos?

Bem, na questão da leitura, também é preciso ter consciência da sua importância para o nosso desenvolvimento intelectual, cultural, comunicacional… Se cada um de vós escutar com curiosidade e atenção os jornalistas, os políticos, os artistas, etc, etc, que falam, por exemplo, na televisão, reparem como o seu discurso (a sua fala) é fluente, seguido, cadenciado, bem fundamentado e argumentado…. Podem crer, essas pessoas para falarem assim, para argumentarem assim, etc, etc, é porque leram e leem muito.

 6.       Já agora queira, por favor, partilhar connosco a sua obra “de cabeceira”.

 Prof. José Bento: Livro de cabeceira nem sei o que isso é, fujo sempre dessas “verdades feitas”, dessas “frases chavão”. Eu compro um livro, leio-o e depois coloco-o no sítio à beira dos outros; gosto de ler e sublinhar, o lápis acompanha sempre a minha leitura… sublinho palavras de que gosto, ou que desconheço, frases que me agradam, expressões que me surpreendem, etc. Por vezes, depois procuro esse livro para reler uma parte ou outra.

Mas quanto a leituras, devo dizer que sou seguidor de alguns escritores portugueses: José Luís Peixoto é um deles; Valter Hugo Mãe é outro; Mia Couto, que é moçambicano, também; e o que é que significa segui-los? Quando tenho notícia de que saiu um novo livro deles, vou à livraria, compro-o e leio-o. Já fui seguidor de José Saramago e de Mário de Carvalho (deste ainda sou) e doutros...

 7.       Temos vindo a ler/dramatizar o texto de Gil Vicente, “Auto da Barca do Inferno”. O cómico está muito presente. Na sua opinião, qual a importância do humor na vida das pessoas?

 Prof. José Bento: Para mim humor é igual a inteligência; quem tem humor é inteligente.

8.       Já percebemos, por experiência própria e por informações dos nossos professores, que a nossa Literatura é muito rica, enquanto poetas líricos e romancistas, mas “pobre”, enquanto criadores de texto dramático. Haverá alguma razão plausível que justifique esta disparidade?

Prof. José Bento: É uma questão à qual não sei responder. Contudo, sendo verdade que a desproporção entre autores líricos e narrativos e autores dramáticos seja evidente, temos excelentes dramaturgos como Gil Vicente, Almeida Garrett e Luís de Sttau Monteiro, que já não é nada mau.

E a verdade é que qualquer (?) texto poético e narrativo também pode ser dramatizado.

 9.       Soubemos do concurso literário António Celestino. Na nossa região, há outros autores aos quais deveríamos consagrar mais atenção?

 Prof. José Bento: Para além de António Celestino, temos também o poeta João Augusto Bastos (falecido), Dário Bastos (também falecido) José Abílio Coelho, que é contista e também tem algumas histórias infantis publicadas; Cunha de Leiradella, este com alguma reputação a nível nacional e no Brasil, que também já escreveu uma peça de teatro chamada “As Pulgas”); António de Sousa e Silva, que escreveu duas peças de teatro. Tó de Porto d'Ave é também um autor com obra publicada, sendo ainda um jovem e com muito talento.

Não esquecer também o autor Manuel Joaquim de Sousa, que é professor de Português e de Literatura na nossa Escola Secundária, que já tem dois livros publicados, um de poesia, outro em prosa, um romance, deixando o desafio à turma para que descubra este nosso escritor.

10. Ouvimos ainda dizer que tem concretizado muita pesquisa sobre topónimos. Partilhe connosco algum que, pela sua espetacularidade, seja aliciante saber.

 Prof. José Bento: Fiz um estudo sobre a toponímia da vila da Póvoa de Lanhoso a que dei o nome de “Rua Central”. O estudo da toponímia é muito interessante e uma das leituras pertinentes é analisar as escolhas políticas dos nossos representantes locais em determinadas épocas da história, a toponímia reflete essas tendências e a mudança de topónimos ou a sua alteração; geralmente são nomes de políticos ou datas que representam mudanças políticas.

Aqui na Póvoa de Lanhoso, como estamos numa zona rural, há alguns nomes ligados a essa realidade e é bom que se mantenham porque são testemunho de uma época; depois há outros nomes ligados a figuras locais consideradas importantes, que também tem a ver com as políticas…. Enfim, há muitas vertentes a considerar.

Um dos topónimos mais carismáticos que eu estudei foi a rua e o lugar dos Infernos, que é muito peculiar; não descobri a origem desse topónimo, mas fiz uma interpretação que considero pertinente e que a turma poderá ler com a ajuda do vosso professor José Medeiros.

 11.   Agradecemos-lhe a disponibilidade e desejamos-lhe sucesso, aproveitando ainda para nos aconselhar sobre os caminhos que devemos percorrer para que possamos alcançar os nossos objetivos e, por isso, sermos mais felizes. Mais uma vez, muito obrigado.

Prof. José Bento: Para quem tem objetivos, o melhor caminho para os alcançar é apenas um: trabalho.

Há mesmo quem diga: trabalho, trabalho, trabalho.

Não tenham ilusões, sem trabalho nada se consegue, nem a felicidade.

O vosso professor Medeiros, que é um professor de excelência, pode dizer-vos qual o significado da palavra trabalho.

Muito obrigado pela vossa atenção.

 Alunos do 9º Ano (turmas C e D).