terça-feira, 23 de maio de 2023

Para ti "Manel"

Já fez um mês que partiste, Manuel…e a tua presença continua nos muitos recantos desta escola que foi quase uma segunda casa durante 30 anos!

A tua cerejeira continua a crescer, está frondosa, mas com poucas cerejas neste ano de seca e com os melros sempre a debicarem as melhores!

Para falar da morte que todos sabemos ser uma inevitabilidade e por natureza envolta em sofrimento, decidi dar a conhecer o livro de Inês Barros Baptista, cujo título foi retirado deste poema de Fernando Pessoa, um dos poetas que apreciavas:

A morte é a curva da estrada

A morte é a curva da estrada,
Morrer é só não ser visto.
Se escuto, eu te ouço a passada
Existir como eu existo.

A terra é feita de céu.
A mentira não tem ninho.
Nunca ninguém se perdeu.
Tudo é verdade e caminho.


Em “Morrer é só não ser visto”
, fala-se do Luto de coração aberto; são testemunhos de pessoas em luto, que nos explicam a sua forma de sentir cada uma das perdas que tiveram e nos iluminam o caminho, mostrando outras formas de encarar situações perturbadoras e disruptivas da nossa vida.

Para a autora e muitas outras pessoas, “a morte não tem de ser necessariamente o fim, podendo mesmo ser o início de um outro tipo de relação”.

 A mesma ideia foi expressa pelo senhor padre que oficiou a missa de corpo presente. Cito um excerto do poema que leu, cuja autoria é dúbia, mas a mensagem é clara:

(…) Eu não estou longe,
apenas estou
do outro lado do Caminho...

Você que aí ficou, siga em frente,
a vida continua, linda e bela
como sempre foi.

Henry Scott Holland  (ou  Santo Agostinho?)

“Morrer é só não ser visto”. É isso que acontece às pessoas que amamos. Não está o corpo, mas está o espírito, a alma, a memória, a anamnese.

Contudo, por muito que as crenças religiosas e outras nos ajudem a mitigar a dor da perda física, a realidade é que deixa de haver toque, cheiro, fala…

Que bom seria voltar a conversar, como fazíamos amiúde na biblioteca, sobre o prazer do trabalho do campo, dos gatos, galinhas e raposas, dos livros lidos, a ler e a escrever, da tua e da minha cidade, do amor à família e da dedicação à escola…

O teu merecido descanso não devia ter sido naquele pequeno pedaço de terra, mas quis o destino ou a má sorte que assim fosse.

A tal inevitabilidade chegou. Essa maldita doença sugou as tuas forças e venceu a tua luta.

Ainda que do outro lado do caminho, ainda que sem ser visto, estarás sempre entre nós.

 


 Rosa Sousa